Artigo definido
Marcos Cordeiro de
Andrade
Caros Colegas,
Certa vez, lá pelos anos setenta,
um colega brincalhão (invejoso ou até mesmo vingativo), pôs um anúncio no
jornal de domingo: “Vendo fusca zero (2.000 km) pela metade do preço ao
primeiro que chegar, motivo – pânico de dirigir depois de presenciar acidente.
Procurar fulano amanhã na Ag. Fimag do Banco do Brasil”. No dia seguinte,
segunda feira, extensa fila de candidatos com o jornal debaixo do braço dobrava
o quarteirão antes do expediente. E o “anunciante” teve que faltar ao trabalho
por mais três dias.
Isso é apenas uma amostra do que
move espertalhões que levam a vida querendo se dar bem com ganhos fáceis. Há
verdadeiros profissionais da busca por pechinchas que pesquisam anúncios. Mas
nem todos procuram apenas ofertas como a do exemplo acima. Existem os que vivem
debruçados nos cadernos de reclames pesquisando “gafes” midiáticas onde o
anúncio chamativo propaga vantagens com preços impossíveis de se praticar, mas
que, em que pese tratar-se de erro gráfico de impressão, ou de informação, o
pobre anunciante é obrigado por Lei a vender seu peixe quase de graça, como
divulgado.
Há também os garimpeiros dos
corredores de tribunais que se ocupam em impetrar ações de reparação em
dinheiro. A esses não importam os motivos, pois são profissionais ecléticos –
não escolhem vítimas nem fundamentações. Para eles não há ética a respeitar nem
escrúpulos que cerceiem essa sua atividade paralela. Normalmente são elementos
frustrados, invejosos e desleais assalariados de vencidas carreiras pífias por
falta de capacidade e vontade de trabalhar. São figuras que se acostumaram a
viver de expedientes ortodoxos para ganhar dinheiro sem fazer força,
normalmente à custa de quem trabalhe por eles ou que tenham feito nome para
lhes dar sombra. Suas presas preferidas são as grandes empresas, mas, à falta
de uma “boa causa” contentam-se com pobretões que são bem mais fáceis de lidar,
pois não têm dinheiro para pagar advogados nem conhecem como eles os caminhos
da pouca vergonha que justificam o ganho fácil. Aproveitam-se também da boa
índole dos que não têm por costume frequentar delegacias nem fazem conchavos
com a ilegalidade.
E hoje, com a pujança alcançada
pela comunicação virtual, abriu-se um garimpo inexaurível disponível a essa
classe de “trabalhadores”, cuja única especialização é bater ponto em
delegacias, cartórios e tribunais registrando ocorrências que lhes valham jogar
mais um processo de reparação financeira nas costas de pobres diabos que ousem
cruzar seu caminho. E fazem uso dessa prática sem pudor nem piedade com
acusações de calúnia e difamação ao pegar no ar palavras que nem sempre foram
direcionadas a eles e, pior de tudo, deturpadas no boletim de ocorrência e na
fundamentação da petição inicial dos processos que lhes garantem o sustento -
que o trabalho não lhes dá por absoluta falta de caráter e disposição de serem
honestos.
E ninguém está livre deles. Nem
há antídoto que previna o efeito do seu veneno. A única coisa a fazer é falar
pouco em presença de estranhos, não falar nada na sua ausência e tampouco
escrever coisas que possam ferir suscetibilidades, mesmo com o melhor dos
propósitos. Mas isso é difícil de seguir para aqueles que se dedicam a bem informar
repassando comentários e transmitindo conhecimentos – seus e dos outros – como
no caso de moderadores de Blogs, o milagre da informação virtual.
No momento enfrentam tempos
difíceis os que lidam com a palavra escrita ao nominar pessoas pressupondo o
sexo que aparentam. O que outrora era definido pelo visual sem causar traumas,
hoje somente um acurado exame clínico ou psicológico pode mostrar ao mundo.
Ainda mais quando determinados seres teimam em aparentar o que não são. Mas
que, ao se julgarem ofendidos na sua sexualidade, botam a boca no trombone
caindo de pau em cima de quem cometeu o terrível engano de usar o artigo
definido erradamente. Esquecem que seria mais simples sair do armário quando,
sabidamente, têm as suas chaves.
Se não bastassem os gramáticos e
lexicólogos de plantão a me policiar (nem sempre doutos, comumente entendidos),
tenho que cuidar para não pronunciar aleatoriamente termos que definam a
condição sexual de outrem, se assim eles possam julgar. Estou proibido de
escrever, por exemplo, o artigo definido em citações como: o cidadão; a cidadã;
o senhor ou a senhora; o homem ou a mulher.
E por aí afora. Assim, melhor será pensar na metáfora “o sexo dos anjos”
ao me referir a qualquer ser humano doravante.
Pior que isso é que não mais
posso recomendar “seja homem” ou “seja mulher”, pois corro sério risco de ouvir
de volta o indefectível “teje” preso. Na dúvida, melhor usar uma frase unissex,
tipo “honre suas calças”.
Bom mesmo era no tempo dos meus
avós onde se podia usar sem sustos os artigos definidos masculino e feminino.
Muito embora lá atrás, como aqui e agora, também houvesse grandes armários a
esconder preferências sexuais – onde, também, havia respeito a essas escolhas
quando assumidas. Coisa de Macho. Oh, desculpem, quis dizer COISA DE GENTE
HONESTA CONSIGO MESMA!
Por isso serei menos explícito
daqui em diante e, consequentemente, menos contundente quando nominar pessoas
apenas pelos artigos definidos “O” ou “A”.
Haja saco!
Marcos Cordeiro de Andrade – Curitiba (PR), 24 de fevereiro
de 2013. www.previplano1.com.br
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