domingo, 24 de dezembro de 2023

Natal do Eu sozinho

 

NATAL do Eu sozinho

Marcos Cordeiro de Andrade

Aos 84 anos de idade, minha outrora frondosa árvore genealógica perdeu o viço em podas sucessivas, operadas pelas mãos Divinas Natal após Natal. Hoje, conformado, vejo nela apenas o toco seco de um tronco enrugado cortado rente, ostentando resguardados dois raminhos promissores sugando o sopro da vida, que Deus me reservou como filhos. Um deles, o mais novo, age como o anjo da guarda protegendo minha velhice solitária.

Com esse pensamento, preparei meu espírito para passar o Natal desacompanhado. Talvez o mais sozinho que jamais esperasse ter, mesmo como consequência natural da mecânica que rege nossas vidas.

Com o passar do tempo, a acomodada presença de entes queridos à volta da mesa do Natal vai se reduzindo, por conta de ausências que se dão pela vontade de Deus. Justificando-se por mortes ou afastamentos em busca de novos horizontes, o esvaziamento é gradativo e ninguém está livre do processo. Pelo visto, a cada ano o Natal é menos pródigo em proporcionar o calor humano da festividade. Sem esquecer que, quanto mais longevo o vivente, mais propenso à fadiga do costume de partilhar presenças – mormente entre familiares.

Em que pese tudo isto, neste Natal de solidão não vencida cumprirei a tradição da Ceia em mesa compartilhada e farta na medida do possível. Porém, se diferenciando pela escassez de convidados que o tempo não deixou reunir. Será a Ceia do Eu Sozinho esta que não me permitirá ver ninguém à volta em qualquer cabeceira que ocupe. Mas, resignado pela sujeição imposta, dividirei uma hipotética mesa repleta de convivas convocados pela imaginação de um saudoso anfitrião solitário.

Hoje não esperarei pela Missa do Galo para iniciar a ceia do Natal. Assim, terei tempo de incluir nas orações os nomes dos “presentes” - que nunca foram tantos.

De modo que também o seu nome, que me lê agora, seja lembrado juntamente com o de todos os que frequentaram as mesas dos meus Natais passados. E como a fantasia não respeita limites, ao preencher a relação deste ano me darei ao luxo de incluir os que sempre quis ter comigo, agora sem o remorso de roubar sua presença às mesas das suas escolhas. Por isso, sem sair do lugar que ora me cabe, peço permissão para que os alcance nas suas reais mesas natalinas. E ali, num abraço fraterno de FELIZ NATAL, pedirei ao Aniversariante que nos recomende ao Pai para que nos dê PAZ, SAÚDE e TRANQUILIDADE.

AMÉM!

Marcos Cordeiro de Andrade – Curitiba (PR) 24/12/2023.

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